Me recuso a dizer teu nome, com medo de que a palavra se suje ao passar por minha boca pecaminosa e vil. O acovardamento sempre pautou nossa relação, e não poderia agora mudar, visto que nada mudou desde então.
Desde a gênese da paixão que me sequestrou na calada da inocência, nunca fui senão covarde, na frenética tentativa de findar a maldição da tua invasão sobre mim. Nunca consegui, e talvez por isso esteja ainda hoje, encontrando meios de ofuscar tua presença em minha mente, e formas de camuflar teu nome em meus escritos.
Hoje te chamo Dindi, nome de rio, porque assim como dito por Heráclito, um homem jamais entra duas vezes no mesmo rio. E assim me sinto para contigo, onde em tantas vezes mergulhei, e no entanto nunca encontrei a mesma água de antes. Sempre com a mesma magnética atração, mas nunca na mesmice de se permanecer estática. É teu movimento, tua correnteza, teu variado microcosmos que me mantém submerso, intruso como um invasor, que não encontra ali predador além de si próprio, enquanto recusa alterar a fauna ecossistêmica quase sagrada que possui em si, graças a fertilidade de suas águas, ternura de suas ondas, e pórtico ao divino que te cerca, éden descido em corpo e alma. Ou rio e leito.
E te chamo, Dindi. E te clamo, Dindi, com a covardia de chamar-te por codinome, na angústia dos meus versos tortos, escritos na língua pré-falida. E dói. Dói, porque corres, e corres porque és movimento, livre a correr por veios que não cavou, e a desaguar em mares que não os meus. Dói, porque a antropodisseia que me causas é como o caminhar no sertão da escuridão e do medo, guiado pela luz da única estrela, que de tanto seguir, a cada passo fica mais longe, e a cada dia, mais brilhosa.
Dindi, sei que vou embora, mas não se preocupe. Se vivo, fostes minha sina, morto, serás minha mais bela lembrança. Falsa memória da alegria, presente cósmico envolto num embrulho em putrefação.
Obrigado, dindi. Continue fluindo, pois a voluptuosa correnteza fez todo o curso deste sortudo náufrago, e carregará para sempre as cinzas purificadas do teu defensor, finalmente podendo descansar em ti, enquanto houver eu e você.
E finalizo meus versos com a pureza da palavra, e digo te amo. Te amo como nunca, te amo como jamais, te amo como ninguém. E tornarei a pensar, e quem sabe, dizer, até meu último dia.
Ai, Dindi, se soubesses o bem que te quero….
Nota de rodapé: Textos escritos durante crises tendem ser confusos aos leitores. Peço desculpas pela eventual perda de tempo lendo minha confusão mental.